27/12/2024 strategic-culture.su  5min 🇸🇹 #264629

Os Eua militarizam a Guiana para derrotar os Brics

Raphael Machado

A escalada na militarização da Guiana acompanha a ampliação nas operações da ExxonMobil nas águas disputadas próximas ao Essequibo.

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Recentemente, em seu programa "Maduro live de repente", o Presidente Nicolás Maduro da Venezuela lançou um alerta sobre a militarização da Guiana, afirmando que o SOUTHCOM dos EUA possui uma influência cada vez maior sobre os assuntos internos do país caribenho.

Isso vem no esteio de uma escalada de tensões que se intensificou entre o final de 2023 e o início de 2024, para logo vermos uma suavização das relações entre ambos países, até o momento presente. No centro das controvérsias entre Venezuela e Guiana, como sabemos, está a região do Esequibo, bem como seus amplos recursos naturais e sua posição estratégica.

Mas apesar da suavização das tensões, já vimos em um  artigo anterior nosso publicado na Strategic Culture Foundation em julho, o período abril-julho viu aviões F/A-18F sobrevoando a capital da Guiana, a Major-General Julie Nethercot visitando o país para discutir o aumento da cooperação bilateral e a participação da Guiana nos exercícios militares Tradewinds 2024, guiados pelos EUA.

Assim, ao contrário daquilo que foi dito em janeiro de 2024 por Irfaan Ali, de que a Guiana não se converteria em uma base militar dos EUA, o segundo semestre do ano tem confirmado as tendências já vistas nos seis meses anteriores, em discordância com o presidente do país caribenho.

Em 28 de novembro, por exemplo, foi reinaugurado o Aeródromo Brigadeiro Gary Beaton, em Eteringbang, uma base aérea ampliada que será usada para patrulhamento pela Guarda Costeira dos EUA. A base em questão fica poucos metros de distância do Rio Cuyuní e da base venezuelana da Ilha de Anacoco. A justificativa é de que como essa zona não conta com vias terrestres ou fluviais, a base aérea permitirá a realização de missões através de aviões ligeiros monomotor ou bimotor.

Dias depois, já em dezembro, o SOUTHCOM concluiu os trabalhos de ampliação da estação naval fluvial de Ramp Road Ruimveldt, em Georgetown, capital da Guiana. A realização desse trabalho se dá dentro da lógica da cooperação militar e dos exercícios conjuntos entre a Guiana e os EUA, como o já mencionado Tradewinds 23, com a Guiana recebendo também do Departamento de Defesa dos EUA algumas lanchas patrulheiras (Metal Shark) para a sua Guarda Costeira.

O SOUTHCOM também ampliou, na mesma época, um novo hangar e ampliou instalações já existentes da Força Aérea da Guiana no Aeroporto Internacional Eugene F. Correia-Ogle, bem como estações repetidoras de rádio e as instalações da Escola de Treinamento Anfíbio da Selva.

Na mesma época, Irfaan Ali estava visitando o SOUTHCOM para discutir a cooperação militar entre ambos países. O conteúdo específico da conversa, porém, não foi divulgado.

Mas sabemos que além das embarcações patrulheiras, os EUA têm fornecido sistemas de vigilância e veículos blindados destinados a melhorar a capacidade da Guiana de monitorar suas extensas fronteiras e garantir o controle de zonas marítimas onde estão localizados campos petrolíferos de alto valor estratégico - e que são reivindicados pela Venezuela.

Outro aspecto da parceria foi a assinatura de um acordo de cooperação em segurança cibernética, reconhecendo a crescente importância da proteção de infraestruturas críticas em um mundo cada vez mais digital. Especialistas do Departamento de Defesa dos EUA trabalharam em estreita colaboração com as forças armadas e órgãos governamentais da Guiana para implementar medidas que reforcem a segurança das redes de comunicação e minimizem os riscos de ataques cibernéticos.

Isso vem no esteio da intensificação do papel da dimensão cibernética nos conflitos híbridos contemporâneos, em que o choque cinético entre forças militar não raro é precedido por operações cibernéticas voltadas para perturbar os fluxos comunicacionais, as logísticas de transporte, e outras operações das quais os exércitos modernos dependem. Talvez não casualmente, a Venezuela foi um dos países mais afetados por ciberataques durante o ano de 2024 - com destaque para o período eleitoral com 30 milhões de ataques por minuto - não em termos quantitativos, mas no que concerne as fragilidades sistêmicas do país diante desse tipo de operação.

Essa escalada na militarização da Guiana não deve ser casual. Uma forte evidência disso é que ela acompanha a ampliação nas operações da ExxonMobil nas águas disputadas próximas ao Essequibo, com a aquisição pelo conglomerado petrolífero da unidade flutuante de produção, armazenamento e transferência (FPSO) Prosperity da SBM Offshore, operando em Payara, o terceiro desenvolvimento de petróleo offshore da Guiana no Bloco Stabroek.

Aqui não se pode subestimar o papel do Big Oil na geopolítica do Caribe. As previsões para 2027 são de que a Guiana estará extraindo mais petróleo do que a Arábia Saudita ou o Kuwait, conforme a produção aumenta 20% ano após ano desde a descoberta do campo de petróleo Liza em 2015.

Na medida em que os países dos BRICS se movem para integrar países da OPEP em suas fileiras para eventualmente passar a controlar os preços do mercado e instrumentalizá-lo no projeto de desdolarização e de busca por uma alternativa para o dólar, tornou-se estratégico para os EUA encontrar maneiras de escapar desse cerco encontrando e dominando novos poços de petróleo ao redor do mundo.

A Guiana será uma das peças centrais neste esforço.

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