
Raphael Machado
Os países da OTAN estão tentando usar o Brasil para se livrarem de equipamento antigo, e se o Brasil continuar aceitando definitivamente não vai conseguir incrementar seu poder militar nem tão cedo.
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Nessa semana saiu o ranking de países do Global Firepower para o ano de 2025. O ranking é construído por especialistas que organizam os países conforme o seu poderio militar a partir de uma miríade de critérios que vão desde os recursos humanos, a estrutura econômica e recursos naturais e, naturalmente, o hardware militar em posse dos países.
Naturalmente, sempre é possível fazer críticas a esses tipos de rankings e ele não serve como um bom preditor do resultado de um eventual engajamento militar, já que isso depende também de decisões estratégicas e táticas, bem como de alinhamentos doutrinários, que não podem ser quantificados num ranking.
A maioria das posições no ranking não surpreende muito, mas considero relevante falar sobre o Brasil à luz de algumas notícias recentes sobre o âmbito militar do país.
O gigante da América do Sul foi qualificado em 11º. Uma boa posição no geral, se não se leva em consideração o PIB (9º), tamanho (5º), população (7º) e, ainda mais importante, as pretensões brasileiras, expressas através dos BRICS, de serem um polo numa ordem mundial multipolar.
O poder militar é determinante tanto para falarmos sobre soberania concreta, quanto para falarmos sobre a aptidão de um país para se tornar polo num mundo multipolar. E o Brasil está ligeiramente aquém daquilo que é necessário e correspondente a seu potencial.
O problema basilar do Brasil, no que concerne o poder militar, é a desindustrialização do país, que não poupou a indústria bélica. Com o caso mais recente da crise da Avibras, o Brasil tornou-se um país com dificuldade para suprir as suas próprias necessidades de equipamentos militares dos mais diversos.
O fenômeno da desindustrialização, porém, é geral e não parece que o Estado brasileiro está conseguindo enfrentar essa tendência. Ao abraçar políticas econômicas neoliberais, o Brasil abriu mão de impulsionar o desenvolvimento industrial através de amplos investimentos infraestruturais.
Nessas condições, torna-se inevitável preencher as lacunas através de compras militares internacionais. Isso, em si, já representa uma brecha na soberania nacional - totalmente apoiada no poder militar - mas acaba sendo uma inevitabilidade.
A questão, aí, torna-se uma de quais escolhas fazer.
No mês de outubro, a Força Aérea Brasileira anunciou a compra de 11 helicópteros UH-60L Black Hawk dos EUA por 1.2 bilhão de dólares. Trata-se de helicópteros que serão usados em missões de resgate, transporte de tropas, missões logísticas e ações humanitárias na Amazônia e no litoral. Considerando o papel das Forças Armadas na Amazônia, pode-se pressupor também que serão usados no combate ao narcotráfico.
Mas esses helicópteros não são novos. São helicópteros que têm aproximadamente duas décadas de operação. E apesar do governo brasileiro ter considerado que não deveria haver competição pela oferta de helicópteros, os Black Hawks não estão nem mesmo entre os melhores dos EUA, que dirá entre os melhores do mundo. O Mil Mi-28 Havoc, o Kamov Ka-52 Alligator, da Rússia, e o Changhe Z-10, da China, são bem melhores. E mesmo a OTAN tem helicópteros melhores, como o Eurocopter Tiger e o AH-64 Apache.
Tecnicamente, portanto, os EUA estão vendendo "velharias" para o Brasil e por um preço muito acima do razoável.
Agora, a Alemanha ofereceu 65 tanques Leopard 2A6 e 78 blindados Marder 1A5 para o Brasil. Tanto os Leopards quanto os Marders estão sendo, como sabemos, usados na Ucrânia pelo regime de Zelensky - sem muito sucesso. Ao contrário, a Ucrânia já perdeu boa parte dos Leopards recebido. Os tanques - pesados e caros - têm tido dificuldade de serem usados com eficácia no campo de batalha.
Os tanques em questão foram adaptados do modelo anterior, o 2A4, e têm pelo menos 40 anos de uso. Ainda assim, custam 15 milhões de euros. Ademais, em tempos recentes, o Brasil teve dificuldades de adquirir peças militares para equipamentos de origem alemã.
As Forças Armadas do Brasil, porém, parecem dessa vez ter se pronunciado no sentido de que os tanques alemães talvez não atendam às necessidades brasileiras. Ainda não está definido que esses tanques alemães velhos não serão adquiridos, mas o Brasil tem outras opções.
O problema é caso o Brasil decida escolher um Abrams, dos EUA, já que Washington não costuma fechar acordos que envolvam transferência de tecnologia, o que é de interesse do Brasil.
Em outras palavras, os países da OTAN estão tentando usar o Brasil para se livrarem de equipamento antigo, e se o Brasil continuar aceitando definitivamente não vai conseguir incrementar seu poder militar nem tão cedo.